quinta-feira, 10 de março de 2011

22/03/2009 - Os inimigos íntimos

OS INIMIGOS


ÍNTIMOS

Ela sentiu nojo quando Joaquim

colocou a mão no seu

traseiro e disse com malícia:

— Você está molhadinha...

Valéria, então com14 anos,

passava o fim de semana prolongado

com a família no sítio

de Joaquim, um senhor de 60,

amigo de seu pai. Tinha acabado

de participar de uma “guerra

de água” com os filhos de

Joaquim e entrava na casa

quando foi abordado pelo homem.

Sentiu um ódio mortal e

não se intimidou diante dos

cabelos do senhor, que ria para

ela. Respondeu no impulso:

— Vai passar a mão na sua

mãe, tarado! — e entrou pisando

firme na casa, deixando

Joaquim gargalhando.

Amenina virou o diabo no

resto do feriadão. Sem coragem

de contar para ninguém o

que tinha acontecido, começou

a destratar o dono da casa e

a atormentar a família para ir

embora mais cedo. Só conseguiu

mesmo foi brigar com os

pais, que não entenderam a

mudança de comportamento

da adolescente. Joaquim continuou

a frequentar a sua casa.

Mas ele chegava e ela saía:

— Odeio esse homem! —

Valéria dizia sempre.

A menina amadureceu sem

nunca revelar aos pais o porquê

de tanto ódio contra aquele

senhor de cabelo branco,

melhor amigo da sua casa.

— Meupai não entenderia.

Aos 11 anos,Mariah também

descobriu que tinha um

inimigo íntimo: o tio Binho,

casado com a irmã de sua mãe,

pai de duas gêmeas bebês.

A família deMariah morava

em um sobradinho modesto

na Vila Mariana. Aos sábados

à noite já era tradição: os

tios iam à sua casa jogar buraco

até a madrugada, sempre na

cozinha. Para Mariah, as priminhas

eram como bonecas,

comas quais ela adorava brincar.

E as crianças tinham que

dormir às dez da noite. As gê-
meas tinham uma cama só para


elas, no quarto deMariah e

caíam sempre em um sono

muito pesado.

— Até que um dia eu acordei,

no meio da madrugada,

com aquele homem deitado

comigo, debaixo do meu cobertor,

passando a mão nas

minhas pernas, enquanto cochichava

no meu ouvido com

aquele cheiro péssimo de cerveja

e cigarro: “Não fica assustada.

Sou eu, o tio Binho...”

Tio Binho pulou da cama na

hora que ouviu chamarem o

seu nome, no andar de baixo.

— Não conta pra ninguém,

viu? — ordenou.

Mariah chorou baixinho

um bom tempo, mas não teve

coragem de chamar a mãe.

Dormiu mal, com pesadelos.

Passou o domingo amuada,

mas seus pais acharam que era

uma gripe.

Os sábados à noite viraram

uma tortura para Mariah. Tio

Binho era metódico e tomava

cuidado para não ser flagrado.

Depois que as crianças iam para

o quarto, ele esperava pelo

menos uma hora para ir atrás.

No meio do jogo, dizia que ia

fazer xixi — o sobradinho só

tinha banheiro na parte da cima.

E se metia debaixo do cobertor

da sobrinha para lhe alisar

as pernas e a barriga, e lhe

dar alguns beijinhos. Não passava

disso, mas foram pelo menos

dois anos assim. Só que

Mariah crescia. E planejou um

jeito de acabar com aquilo.

— Eu fiquei com um alicate

embaixo da coberta. Quando

se achegou, fui na orelha dele e

apertei ao máximo. Tio Binho

não pôde nem gritar de dor.

Nem sei que desculpa deu.

Mas nunca mais teve jogo de

buraco lá em casa.

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