segunda-feira, 14 de março de 2011

21/02/2010 - Uma mulher bandida

UMA MULHER


BANDIDA

Quem a vê assim hoje tão

responsável, dona de casa, mãe

de família, não imagina o seu

passado. Iracema vivia com

um 38 na cintura e más ideias

na cabeça. Não consegue esquecer

as ações audaciosas em

que participou quando vivia

em São Paulo. A primeira

mansão que invadiu, o susto

que dava nas empregadas das

casas, as joias e o dinheiro que

levou. Hoje, tudo aquilo está

perdido.Mas ela, só Deus sabe

como, sobreviveu.

Iracema chegou a São Paulo

com pouco mais de 15 anos.

Estava sozinha. Foi viver debaixo

de uma ponte e logo conheceu

uns meninos de rua.

Os garotos faziam pequenos

furtos e vendiam maconha.

Foi assim que Iracema fez seu

primeiro contato com Cirilo.

Era ele o rapaz que entregava a

maconha aos garotos. Se apaixonaram.

E Iracema caiu na

vida bandida.

Com 16, engravidou. A

barriga foi a desculpa para entrar

pela primeira vez no quintal

de uma mansão do Morumbi.

Pediu água para uma

empregada, que muito solícita

a deixou entrar e descansar nos

aposentos de serviço. A mulher

ingênua ficou com pena

da menina. Iracema aproveitou

para observar bem o local,

calcular a altura do muro, as

entradas do casarão. Uma semana

depois, voltou com um

bando de ladrões. A velha empregada

a reconheceu de

pronto e levou um susto quando

a viu com o trabuco na mão.

A trancaram no banheiro e levaramo

que puderam carregar.

A criança nasceu e Iracema

lhe deu o nome de Vitória.

— Uma homenagem ao

meu primeiro grande roubo

— disse a Cirilo, feliz.

Depois, foram vários outros

assaltos. Mas um dia vacilou.

Pegou sua parte do roubo

e foi para a rodoviária, viajar

para a terra dos pais. Queria levar

a menina, com oito meses,

para conhecer os avós. Já estava

entrando no ônibus quando

foi reconhecida e presa. A

criança foi para um abrigo.

Ela, para a cadeia. Apanhou

que nem uma desgraçada.

— Primeiro da polícia, depois

das outras presas. Só parei

de apanhar quando parei de

gritar de dor — lembra.

Ficou presa por quatro

anos. Enquanto isso, sua filha

crescia no abrigo.

— Isso eu consegui: graças

ao meu bom comportamento

na cadeia, Vitória não entrou

na fila da adoção.

Quando saiu, decidiu ser

puta. Depois, conseguiu fazer

faxina em um bar, que lhe

abriu as portas de uma casa,

depois de outra e outra. Por

anos, viveu assim, como faxineira.

Soube que Cirilo tinha

sido preso e virado pastor na

cadeia. Solto, foi para o Rio de

Janeiro e abriu uma igreja. Ela

nem pensou em ir atrás dele.

Conheceu outro homem

que não quis saber do seu passado.

Gostou dela e adotou a

sua filha. Se casaram, tiveram

um menino e semudaram para

o interior. Ele abriu um bar

na praça principal da cidade.

Faz comida para caminhoneiros.

Vitória já tem 20 anos. O

filho do casal, Agnaldo, tem

10. Iracema nunca mais trabalhou

fora. Só ajuda o marido

no bar.Mas sempre seu olhar

brilha quando no telejornal

escuta uma notícia de mulher

bandida, com arma na mão,

fazendo assalto. Ela sabe que

agiu errado, poderia ter morrido,

se arrepende até, mas no

fundo, no fundo, sente um

baita orgulho de ter conseguido

sobreviver a tudo aquilo.

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