quinta-feira, 10 de março de 2011

21/06/2009 Três mulheres agora sós

21/06/2009 Três mulheres agora sós Uma colecionava tudo o que o marido publicava. Colava os recortes em folhas de papel sulfite, organizava numa pasta e, depois, quando o número chegava a 50, mandava encadernar. Ela também é escritora, mas não teve o mesmo cuidado com os seus textos. O que lhe importava era o que ele fazia, tão bom, tão precioso. Ela dispensou trabalhos, propostas, só para tomar conta dos trabalhos dele. A outra adorava organizar festas. Era produtora cultural. Quando solteira, vivia rodeada de amigos, que a chamavam para todas as baladas. Depois que casou, aos poucos passou a organizar só as festas do marido e dos amigos do marido. Sua turma, quando percebeu, era a do marido. Largou a profissão e seus companheiros de balada desapareceram. Também deixou de lado seus amigos mais íntimos, que não frequentavam a sua casa. Quando percebeu, mal se lembrava de sua própria turma. A terceira era uma liderança nata. Ganhava bem mais que o companheiro, mas não se incomodava com isso. Pagava seus cursos, suas saídas, seus remédios e até suas cervejas. Mas, quando ela adoeceu e precisou de sua companhia no hospital, ele não foi. Não gostava do ambiente e havia trabalhado muito, estava cansado. Ela ficou chocada com a indiferença. Mas perdoou. Sarou e decidiu voltar a estudar. Ele, então, foi contra. Não queria ficar sem a companhia dela durante as noites da semana e aos sábados. Encontrei as três num dia desses, bebendo no Barão de Itararé, no Centro da cidade. Joana, a colecionadora de recortes, estava inconformada: o marido a havia largado tinha pouco mais de um mês. Ela não parava de chorar e não sabia mais qual vida iria organizar, que trabalhos mandaria encadernar. Na verdade, não sabia como recomeçaria, depois de mais de 15 anos abrindo mão de si e vivendo só a vida do outro. — O terapeuta me disse que me anulei por causa dele. E acho que é isso mesmo. Eu abri mão de empregos e trabalhos que ele desaprovava. Agora, sem ele em casa, a vida não tem mais sentido. É como se alguém tivesse morrido. Cristina, a produtora de festas, estava separada havia dois anos. Ainda amava o ex, mas dizia que estava “sarando”. Não organizava mais festas. Ainda estava só e, confessou, sentia uma saudade enorme daquela companhia. — Ele arrumou uma namorada no mês seguinte à nossa separação. Mas, o que mais me magoou é que, quando eu me separei, todos os nossos amigos ficaram do lado dele. Eu achei que eram todos meus amigos também. Mas não. Eu tive que refazer a minha agenda, buscar contatos que eu havia perdido. Meus conhecidos antigos me disseram que não entendiam por que eu havia me afastado deles. Eu nem percebi que tinha me afastado tanto... Silmara, a que pagava todas as contas, era a única feliz das três. Estava planejando uma viagem ao exterior. O marido a deixou quando ela resolveu voltar a estudar. — Chorei muito durante uma semana. Mas, aos poucos, percebi tudo o que eu não estava fazendo por causa dele. Ele até quis reatar um mês depois, mas eu não aceitei. Foi ele, então, quem chorou.

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