DORES DA
TRAIÇÃO
Magali sempre falava para
quem quisesse ouvir:
— Eu não perdôo a traição.
Parecia certo.Afinal, Juarez
teve coragem de arrumar outra
mulher quando a filhinha
deles ainda era um bebê.Nada
parecia mais cruel e egoísta.
Com a maternidade,Magali
havia perdido um pouco
da exuberância. Também não
tinha a mesma disposição para
o sexo. Mas era uma fase — todo
mundo dizia — que passaria
quando a criança crescesse
um pouco. Por isso,Magali só
teve apoio quando decidiu colocar
Juarez para fora de casa.
Ele foi morar com a outra.
Só que ninguém podia negar
uma coisa: Juarez era um
bom pai. Ele era amoroso e
atencioso. Irresponsável, é certo,
mas seus olhos tinham
sempre um brilho de paixão
quando viam a pequena Isabela,
chamada de “meu docinho”.
Isso, porém, não tinha
importância diante do ódio
que Magali alimentava pelo ex.
E ela criou a filha repetindo
quase que diariamente:
— Você não tem pai.
Isabela cresceu impedida
de amar o pai. Toda vez que ele
aparecia, a mãe soltava um
alerta— uma frase para diminuí-
lo ou para demonstrar
que ele era sempre um perigo.
“Cuidado para ele não levar a
sua mesada” ou ainda “Pergunta
para ele quando vai pagar
a pensão direito”.
A pequena via o pai com
uma curiosidade carinhosa.
Queria do fundo do coração se
aproximar dele, saber o que
pensava. Mas sempre parava
no aviso autoritário da mãe:
— Seu pai não presta!
No fundo, Isabela sentia
falta do pai, mas nunca reconhecia
isso. Se tentasse, o que
vinha era a culpa que a mãe logo
tratava de fazê-la sentir:
— Ele nos traiu!Me deixou
quando você ainda era bebê.
Mas ainda bem que crianças
se transformam emadultos.
Um dia, Isabela arrumou
um namorado. A mãe não
gostou e passou a criticar o
moço do mesmo jeito que falava
mal de Juarez. E também escorraçou
o segundo, e depois o
terceiro, e ainda o quarto namorado
da filha. Ela era antipática,
arrogante e grosseira
com os rapazes. E, pelas costas
deles, sempre repetia amesma
ladainha preconceituosa.
— Esse aí parece outro traste
igual ao seu pai.
Foi então que Isabela começou
a desconfiar que algo
estranho acontecia com Magali.
Umdia, no meio de uma
das brigas que então eram frequentes
entre elas, encontrou a
palavra para o que a mãe era.
— Você é ressentida! Não
consegue amar ninguém! Por
isso não quer que eu namore.
Quase romperam, mas não
foi dessa vez. Só que ainda demoroumuito
até que encontrasse
alguém compaciência
para “levar” Magali com jeito.
Até que Jorge apareceu. Rapaz
bonachão, mas muito apaixonado,
ele resolveu enfrentar
Magali com um pouco de sarcasmo.
Cada patada da sogra
era retribuída com outra. Depois,
aprendeu a ignorá-la. E,
quando decidiram se casar, só
impôs uma condição: queria
morar longe da casa da sogra.
Quanto ao pai? Bem, Jorge
já tinha ajudado nisso também.
Foi ele quem procurou
Juarez e promoveu vários encontros
entre pai e filha. Juarez
agora era um velho irresponsável,
mas de bom coração. E, o
que era mais importante: seus
olhos ainda brilhavam de paixão
quando viam Isabela, sua
pequena e doce Isabela.
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