quinta-feira, 10 de março de 2011

05/04/2009 - Um esporte masculino

UM ESPORTE


MASCULINO

Aos 20 anos ele já se sentia

atraído por ela. Mirna tinha 40

na época. Robson era o estagiário

novo da empresa. Ele a

contemplava à distância, consciente

de que o seu desejo era

um sonho, uma fantasia juvenil.

Mirna era uma das diretoras

de área, casada, tinha filhos,

parecia feliz. E ele ainda

tinha no rosto as espinhas da

adolescência tardia.

Nessa época, Robson decidiu

tentar ser pelomenos um

bom amigo de Mirna. Se esforçou

para se aproximar e aprender

tudo o que poderia no trabalho.

Era sempre dócil, solícito,

atencioso.Mas, por mais

que tentasse, não conseguiu

disfarçar e remover do seu

olhar o desejo que sentia. E,

paraMirna, aquilo não passava

despercebido. Às vezes, jogavam

com olhares cúmplices,

mas ela preferia pensar que as

sensações que tinha eram só

impressões sem fundamento:

—Eu fazia de conta que

não percebia. É que, no fundo,

também me sentia atraída por

ele. Mas pensava: “Mirna, ele é

só um garoto e você está vendo

coisas”. É isso: não acreditava

que ele estava me desejando de

verdade. E deixava pra lá.

Um ano depois, o estágio

acabou e Robson foi embora.

Mantinham contatos esporádicos,

falavam um oi no Orkut

de vez em quando, trocavam emails

nas datas festivas. Mas isso

foi só no primeiro ano.Depois,

sem um bom motivo,

não se comunicaram mais.

Sete anos depois, o rapaz já

formado e comuma certa experiência

voltou a trabalhar na

empresa. Mirna estava em outra

fase pessoal. A aparente felicidade

de tempos atrás não

existia mais. Ela continuava

atraente, mas sua expressão tinha

um peso. Ele percebeu

com tristeza que era uma angústia

que estava prestes a se

transformar em amargor. Para

Robson, parecia difícil transpor

um tipo de barreira que

Mirna construíra em volta dela.

Estava mais fechada, não

queria conversas de corredor,

não havia olhares cúmplices.

— Estou me separando.

Meu marido me traiu — ela

lhe contou, quando ele perguntou

se estava tudo bem.

O rapaz se empolgou com a

notícia. Virou o ombro amigo

de Mirna. Enquanto o casamento

dela se desmanchava, ele

lhe dava livros, convidava para

sair, mandava flores. Mirna,

fragilizada, começou a se envolver.

E se apaixonou.

— Ele era quase 20 anos

mais novo do que eu—me

contou. — E foi um alívio para

mim, naquele período.

O casal resolveu se aventurar

em Machu Picchu. Fizeram

a caminhada para entrar na cidade

pela Porta do Sol, exploraramas

ruínas, tomarambanho

em Águas Calientes. Na

volta, ele passou a frequentar a

casa dela e até a dar conselhos

sobre a criação de seus filhos.

Poucos meses depois, porém,

Robson começou a parecer

inseguro. E, sem explicações,

passou a evitá-la.Mirna

ligava, mas ele nunca estava

disponível. Ela, que achou que

não sofreria mais por amor, se

sentia uma adolescente traída.

—Vai entender essa geração

— me disse outro dia. —

Ele sempre se declarou apaixonado.

Mas, agora que saiu a minha

separação, desapareceu. Só

pode ter ficado commedo da

minha maturidade. Como se

eu fosse muito para ele.

— Mas será? — eu retruquei,

desconfiada. — Pular fora

depois de uma conquista difícil

me parece mais um esporte

masculino. E, o que é pior,

praticado por várias gerações.

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