segunda-feira, 14 de março de 2011

14/02/2010 - Confiar é preciso

CONFIAR É


PRECISO

Mara temia o resultado do

exame. Mas sua intuição e experiência

não estavam enganadas.

Os enjoos, as tonturas,

o nojo do café só podiam ser sinais

de uma coisa: gravidez.

Ela não queriamais filhos. Já

tinha duas meninas. E não

conseguia parar de se sentir

uma irresponsável. Afinal, aos

44 anos e separada há dois, tinha

mais do que experiência

para saber evitar filhos.

Contar para o namorado

seria constrangedor, ela imaginou.

Mas nada além disso. Os

dois se conheciam desde a faculdade,

tinham tido um caso

na época, mas a vida os havia

levado para caminhos diferentes.

Umdia, ambos já separados,

se reencontraram. Estavam

juntos há poucomais de

seis meses, cada um em sua casa,

e se sentiam felizes assim.

O problema era que Valter

acreditava ser estéril. Separado

há cinco anos, ele tinha feito

vários tratamentos durante o

casamento, mas nada havia

dado certo. Seus espermatozóides

eram poucos e fracos. E

as chances de engravidar uma

mulher, remotas.

—Como posso ter certeza

de que é meu? — foi a primeira

coisa que disse, quandoMara

lhe contou. A mulher se surpreendeu

com a reação.

—Como você pode desconfiar

que não é? Eu estou dizendo

— respondeu, grifando

bem o “eu”.

Valter insistia que sua desconfiança

era legítima. Lembrou

sua luta para ter um filho

quando casado, os inúmeros

exames que tinha feito. Por

fim, contou a ela o que ouviu

da mãe certo dia: “Meu filho,

se um dia uma mulher afirmar

que está grávida de você, desconfie.

É golpe da barriga”.

Até aquela frase, Mara refutava

todos os argumentos, ainda

com uma certa paciência.

Mas, com a citação da mãe dele,

se sentiu ofendida. Como

ele poderia desconfiar da honestidade

dela, mulher que conhecia

há mais de 20 anos?

—Por que, com44 anos e

duas filhas, eu vou querer dar o

golpe da barriga? Ainda colocando

a minha vida em risco?

— e botou ele para fora.

Valter voltou no dia seguinte

com um buquê de flores vermelhas

e um par de sapatinhos

para bebês. Pediu desculpas e

prometeu acompanhar a gestação

passo a passo. E fez isso.

Curtiu todas as etapas, deu

apoio nos momentos difíceis,

ajudou a decorar o quarto e a

fazer o enxoval. Os dois decidiram

manter suas casas separadas,

mas ele passou a ficar mais

na casa dela. Nunca falaram

sobre a briga de novo, mas Mara

nunca sentiu a completa

confiança do namorado.

Quando o bebê nasceu,

uma menina que ganhou o

nome de Cintia, a maternidade

presenteou o casal com um

exame deDNA— era de praxe.

Ele abriu o envelope ansioso

e só então teve certeza do

que Mara já sabia. Se sentiu envergonhado,

mas nunca falou

nada sobre isso para Mara.

Cintia já tem 2 anos. O casal

continua em casas separadas,

mas ele fica muito mais na casa

dela. Tem adoração pela filha e

admiração por Mara. Mas, para

ela, ficou um incômodo no

coração. É que não consegue

perdoar a desconfiança, relevar

o acontecido naquela conversa.

Sabe que a filha a uniu a

Valter na vida prática, mas

criou entre eles uma cortina de

mágoa difícil de ser superada.

E, como tempo, intui, tal cortina

vai se transformar em

uma parede dura e completamente

intransponível.

Nenhum comentário: