quinta-feira, 30 de junho de 2011

11/07/2010 Loira e cheia de cachos

07/11/2010 loira e cheia de cachos Verônica entrou esbaforida na cozinha e gritou: — Mãe, descobri, mãe, eu descobri!!! A menina de 5 anos queria contar à mãe com urgência quem queria ser. Ou melhor, com quem queria parecer. Pegou a mãe pela mão e a puxou até a sala. Na TV, o filme da “Sessão da Tarde” era “A Queridinha do Vovô”. A personagem principal, Priscila, era vivida por Shirley Temple. Verônica até suspirava. — Ela é como eu te disse que quero ser, mãe, loirinha e de cabelos encaracolados. E também quero olhos bem verdes. E ter o nome dela: Priscila. Que lindo nome!! É melhor do que Verônica. A mãe da menina não aguentava mais aquela história. Ela entendia que Verônica estava na fase de ter fantasias, mas não conseguia evitar um certo incômodo com o sonho da filha. É que Verônica, assim como toda a família, era morena e tinha os cabelos pretos e bem lisos. Os olhos dela eram amendoados, de um castanho escuro brilhante. Um belo dia, porém, a menina começou a falar que queria ser mesmo loira encaracolada e parecia sofrer por ser diferente do que imaginava. Falava tanto e chegava a chorar quando diziam que era impossível. Assustados, os pais procuraram ajuda profissional. A psicóloga sugeriu que a família não desse tanta importância àquilo, e que também brincasse com a história, entrasse na fantasia, sempre mostrando para a filha que aquilo, como todos os outros faz-de-conta, tem um fim. A mãe, então, comprou uma peruca loira e cheia de cachos para Verônica e começou a chamá-la de Priscila em alguns momentos, sempre em tom de brincadeira. No começo, a menina curtiu a peruca como um novo brinquedo, mas conforme foi crescendo a cabeleira foi ficando de lado. Verônica, a garota morena e de olhos escuros, se transformou na adolescente mais bonita da rua e da escola. E a peruca loira e cheia de cachos — e toda a história que a envolvia — eram só motivo de boas risadas na família. Mas, se Verônica tinha alguma explosão de mau-humor, era de Priscila que a chamavam. Perto dos 17, Verônica se apaixonou pela primeira vez por um rapazote da mesma escola que ela. Precavida, a mãe sempre tentava levar o casalzinho para dentro da sua casa, mas o menino não gostava. A paixão seguiu por alguns meses, até o que o ano acabou e o garoto saiu da escola. Foi a deixa para o namoro acabar. Verônica parecia que ia morrer quando recebeu um e-mail dele, terminado tudo. Como chorou a garota! Mas, como toda jovem nesta fase, também se recuperou rápido. Em pouco mais de duas semanas, já estava se divertindo. E foi num passeio no shopping, com o grupo de amigas da escola, que ela encontrou o ex de mãos dadas com a nova namorada. O encontro foi tão inesperado que Verônica nem teve tempo de desviar o caminho, fingir que não os tinha visto. Ficaram os três frente a frente, e o garoto, então, teve de lhe apresentar a nova namorada: — Oi, Verônica, esta aqui é a Priscila — e ela era loira, com cachos lindos e olhos verdes. Verônica parou de respirar. Lembrou na mesma hora de Shirley Temple e da sua peruca loira jogada em algum canto dentro do guarda-roupas. Pediu desculpas e saiu correndo para casa. Entrou esbaforida na cozinha e gritou: — Mãe, descobri, mãe, eu descobri porque é que eu queria ser loira!!!

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