domingo, 19 de abril de 2009

Só Por Capricho


Publicada em 6 de janeiro de 2008
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A rosa era vermelha. Estava encaixada na persiana da janela azul, de madeira. A flor se destacava de longe. Quando Simone acordou, encontrou lá a rosa. Nas folhas, frases de amor escritas com caneta preta. “Rosa de amor só vale se for roubada”, ela havia dito a Diogo na noite anterior. E elefez a sua vontade. Pulou o muro da vizinha e arrancou a rosa do jardim. A menina se encantou com aquele costume do interior. E, até por ser da cidade grande, lhe choviam pretendentes. E ela decidiu namorar aquele que cumprisse um certo ritual.

Diogo foi o primeiro namorado de Simone. Ela 15, ele 18. Ela linda, ele tímido. Ela virgem, ele no ponto. A paixão foi tão avalassaladora que toda a cidadezinha se envolveu. Torciam por eles. O pai na cidade grande ameaçou. “Se souber de algo que estrague nossa reputação você não volta praí”. A parentalha se ocupou de protegê-los. As tias os levavam para as suas casas, não os deixavam namorar nas praças, nas escadarias da igreja. Os beijos mais íntimos eram dados dentro de saletas, nas varandas das chácaras, longe dos olhos maldosos.

Mas as férias acabaram e ela partiu. Ele ficou, prometendo amor e fidelidade eternos. Meses de namoro à distância eles tiveram. Mas os hormônios da adolescência não param de ferver. E um dia chegou a carta derradeira: “Desculpe, mas me apaixonei por outra aqui. Vamos terminar”.

A traição é um tipo de navalha que entra no coração das pessoas. E foi a dor de um corte que Simone sentiu com aquela carta. Não que fosse fiel. Na verdade, na sua cidade, já ficava com vários. Mas a mulher traída, mesmo a adolescente, é ardilosa. Simone tinha um capricho a ser realizado.

E quando, no Natal, voltou para a cidadezinha, não sossegou enquanto não reencontrou Diogo. Ao vê-la, quase enlouqueceu de desejo. Estavam em um baile. Ele levou a namorada para casa mais cedo. Simone também partiu, mas foi ficar à espreita, no portão da casa dele, na penumbra. E, quando ele chegou, lá estava ela. Linda e cínica, perguntou chorosa: “Mas, por quê?”. E não sossegou até arrancar-lhe um longo beijo. Despedida? Não. Vingança. Simone dormiu feliz aquela noite. Já Diogo não dormiu. Sua consciência pesava.

Vinte anos se passaram. Diogo se casou com a namorada. Parece feliz. Simone teve vários homens, se divertiu pela vida, rodou o mundo, mas um dia também cansou e resolveu parar. Casou e teve filhos. De vez em quando, volta à cidadezinha e encontra Diogo por acaso. E ela ainda se diverte, porque até hoje ele não tem coragem de encará-la como alguém comum. Fica corado e finge que nunca a conheceu. É que até hoje ele sente culpa por causa daquele beijo no meio da madrugada, na frente do seu portão.

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