quinta-feira, 11 de novembro de 2010

Após a meia-noite

Publicado em 04/05/2008

Mariana tinha pouco mais de 14 anos quando descobriu que estava grávida. Não sabia quem era o pai. Estava louca no dia. E se desesperou tanto que pensou em abortar. O que faria com o bebê? O que seria de sua vida?
Mas, aos poucos, foi gostando da idéia de ter um pequeno ser para cuidar. Soube pelo ultra-som que seria uma menina. E, numa noite, depois de sentir pela primeira vez a criança mexer em seu ventre, lhe fez a seguinte declaração:
“Agora que passou o medo do escuro da meia-noite, posso dizer que aceito ser sua mãe. Serei uma mãe precoce, você sabe, mas, no futuro, a gente poderá ir juntas a algumas baladas. Só não vou me drogar tanto como já fiz. Mas talvez você, algum dia, tenha que me carregar para casa. Prepare-se.
Nos primeiros dias da gestação, chorei muito de desespero. Não se entristeça por isso, porque já passou.
Nesta tarde, senti você se mexer na minha barriga e nunca senti emoção e felicidade iguais.
A partir de hoje, vou colocar ao lado da barriga uma música legal pra você escutar toda noite e já ir se acostumando a sons de qualidade. Talvez algum rock progressivo, ou algo de Toquinho — ainda vou escolher —, mas você terá uma música para não se esquecer.
Tentarei ter um parto normal, mas, se na hora o médico disser que você corre riscos, permitirei a cesariana sem vacilar.
Pretendo lhe amamentar até os 2 anos, pra você crescer forte. E vou sempre te ninar no colo, tenha certeza, cantando baixinho a mesma canção que vou escolher daqui a pouco.
Mas não pense que sua vida será só moleza. Você não terá tudo o que quiser, e nem na hora que quiser. Quanto mais espernear, mais dura serei.
Vamos brigar a partir do momento em que você começar a andar, mas nunca vamos dormir sem nos falar, sem trocar beijos e afagos.
Você também não vai comer só tranqueiras. Não sei como farei isso, porque eu mesma adoro doces e salgadinhos, mas resistirei por você.
Quando entrar na escola, estarei ao seu lado nas lições de casa, irei às reuniões chatas de pais e babarei nas festinhas de final de ano, vendo você fantasiada de flor ou de borboleta, dançando sem jeito.
Seremos cúmplices, tenho certeza. Mas acho que na sua adolescência vou me atrapalhar, como minha mãe se atrapalha comigo. Como não brigar e não querer que você faça o que eu acho certo? Como evitar que caia nas mesmas ciladas em que eu caí, confiar na vida e deixar você seguir o seu caminho?
É, não vai ter jeito! Na idade adulta, você terá que me perdoar por todas as discussões feias que teremos. Mas vou preferir mil vezes pagar um terapeuta, com quem você falará sobre nossa tumultuada relação, do que perder você para sempre”.
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