segunda-feira, 3 de novembro de 2008

O FIM DE LINDA FLOR

Publicado em 9 de dezembro de 2007

Linda tinha um sonho. Melhor: Linda tinha um desejo. Queria ser Flor. "Dona Flor, como no romance de Jorge Amado", ela me contou. A fantástica história da professora de artes culinárias que dividia a cama entre o marido vivo e o marido morto fazia minha amiga delirar.
Professora também, Linda sempre via em seu marido Olavo todo o jeitão do farmacêutico Teodoro Madureira, que na história só gostava de transar com dia e hora marcados. Olavo era um aplicado advogado, mas, na sua lista de prioridades, o sexo estava lá pela sexta colocação. A situação só não era pior porque, por exceção à regra, Olavo não gostava de futebol. Sem isso, o sexo seria muito mais raro.
Mas a estabilidade do casamento a deixava tranqüila e relativamente feliz, e ela se contentava em só imaginar que um dia poderia ter um Vadinho como o do livro. Ela criava fantasias com aquele homem safado, que a virasse do avesso de tanto prazer, mas que também lhe trouxesse à vida um pouco do sofrimento e da insegurança que aparecem quando não se tem certeza da lealdade e do amor. Como não acreditava em fantasmas como era o Vadinho baiano, imaginava que tal indivíduo tinha que ser “invisível” — entrar e sair sorrateiramente da sua casa e da sua cama sem ser percebido.
Um dia ela me ligou esbaforida para contar que tinha encontrado o tal Vadinho: era Duda, um rapaz que conheceu na academia. Casado, mas perfeito. “Ele tem até o hálito do Vadinho dos meus sonhos. Estou apaixonada”, disse.
Para colocá-lo dentro de casa, fez o que pôde para aproximá-lo do marido, que passou a confiar no rapaz. Ficaram amigos. Assim, Duda ia à casa de Linda todos os dias, viajava com o casal e os dois aproveitavam as “distrações” de Olavo. No celular, quando Duda chamava, era o nome Vadinho que aparecia no visor. E Linda assinava mensagens para ele com o codinome Dona Flor.
Tudo parecia perfeito, Linda Flor vivia em paz com seus “dois maridos”, quando a tecnologia os traiu. O e-mail que era para ter sido apagado ficou lá, gravado em uma pasta de memória. E foi uma declaração de amor ao seu marido, assinada por uma tal de Flor, que Joana leu naquela noite. As malas de Duda foram parar na rua. E a cópia do e-mail foi parar na tela de Olavo.
A fantasia de Linda acabou aí. Olavo quis o divórcio e, sem ele, ser Dona Flor não tinha a menor graça. A paixão acabou. Duda, que gostava da aventura pela aventura, também não encontrou seu rumo. Sem casa, nunca se tem para onde voltar.
Perguntei a Linda se valeu a pena. “E como não? Sou privilegiada, não acha? Se apaixonar loucamente não é para qualquer uma”.

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